ENSINO-APRENDIZAGEM DE LITERATURA


Talvez o maior lugar-comum da crítica literária no Brasil, hoje, seja o de que o texto é múltiplo. Simples assim: a multiplicidade como algo quase dado, uma característica praticamente a priori das obras, que a interpretação só precisaria atestar ou confirmar. Justamente por ser um lugar-comum, a crença  em uma multiplicidade essencial ou ontológica da literatura não precisa ser ferrenhamente defendida; pelo contrário, ela funciona melhor quando permanece como uma espécie de pressuposto de fundo, frequentemente não declarado, do processo interpretativo. A crença na multiplicidade está presente em todas essas frases, que parecem não precisar de explicação: “esta obra presta-se a infinitas leituras”; ”são inúmeros os sentidos”; ”há uma pluralidade de vozes”; ou até mesmo no nefasto “cada um tem a sua interpretação”. Trata-se aqui, na realidade, deum barateamento brutal da ideia de diferença, que, se, por um lado, está em consonância com tendências culturais e sociais mais amplas, por outro, gera consequências bem determinadas para a prática da crítica no âmbito das Letras e das Ciências Humanas. [...]

 

A poética da multiplicidade encontra sua forma mais apurada na aplicação de teorias. Como tudo é plural, como todo antagonismo foi suprido (fora [...] o antagonismo contra o antagonismo, ou antibinarismo binário), qualquer texto pode ser lido segundo qualquer teoria. Como tudo é dialógico, não importa se você usa Badiou, Barthes, Bataille, Baudrillard, Bhabha, Bourdieu ou Butler (para ficar só no “B”), para o drama renascentista, a épica do século 17, ou no verso livre do 20. No fundo, o verbo “usar” já diz tudo, porque esse tipo de relação entre literatura e teoria é essencialmente utilitário. Determinados autores, como Bakhtin e Benjamin, são tão explorados, são inseridos em debates tão absolutamente díspares, que vale a pena perguntar se ainda faz algum sentido mencionar seus nomes. E é um fenômeno  curioso que, se, por um lado, a crítica da multiplicidade vem questionando o cânone literário, desafiando seu fechamento e reivindicando a inserção de novas vozes, por outro, a teoria vem testemunhando a formação de um cânone próprio, um rol de autores que se tornaram referência obrigatória (inclusive para as novas vozes), cujo conceitos podem, sim, ser problematizados, mas não sua posição a priori como grandes nomes.

Disponível em: https://revistacult.uol.com.br.Acesso em: 17 ago.2014 (adaptado)

 

Sobre a poética da multiplicidade, avalie as afirmações a seguir.

 

I. A multiplicidade é uma característica só recente incorporada pelo texto literário.

II. Há um confronto e, no mesmo momento, um restabelecimento do cânone literário.

III. Uma determinada teoria é capaz de abarcar todas as possibilidades de um texto literário.É correto o que se afirma em




  • I e III, apenas.

  • II, apenas.

  • III, apenas.

  • I, apenas.

  • II e III, apenas.